Lucas Figueiredo
Publisher Record
Overview: O texto do jornalista Lucas Figueiredo em Ministério do Silêncio, lançado pela Editora Record, resulta em 543 páginas de informações que calam fundo no sentimento de toda uma geração. Toca na crença de um projeto social-democrata para o País e na já esquecida solidariedade movida pelo mais puro lirismo e uma sólida confiança nos que tinham a coragem de se opor ao poder opressor dos anos dourados. A bem estruturada pesquisa realizada durante sete anos pelo autor, é uma viagem instigante. Sua leitura esclarece fatos e junta os cacos da História para formatar um conjunto precioso de informações sobre um período conturbado das nossas vidas.
Como repórteres iniciantes e absolutamente obstinados por uma espécie de destemor inconseqüente, jornalistas pagavam para ver e fomos, sem muita consciência dos riscos inerentes e com uma poética determinação no futuro de um Estado de Direito socialmente mais equânime, fiéis aliados das teses liberais. Sob esses aspectos o governo militar tinha razão. As redações, principalmente os que faziam as sucursais dos quatro grandes da imprensa brasileira no Recife “Jornal do Brasil”, “Estado de S.Paulo”, “O Globo” e a “Folha de S.Paulo” – eram claramente favoráveis e, mais do que isso, colaboravam editorialmente com os movimentos da oposição ao regime.
Este repórter não compreende, por exemplo, porque, em1974, a censura “cochilou” e o “JB” do inesquecível Nascimento Britto e da condessa Pereira Carneiro foi o único a veicular, num valioso espaço de uma coluna, a denúncia feita numa pequena sala da Assembléia Legislativa de Pernambuco a um grupo de jornalistas pela então professora Lilia Collier. Visivelmente abatida ela buscava o paradeiro do sobrinho Eduardo Collier. Naquele instante o “desaparecimento” era um mau sinal principalmente para quem pertencia a grupos políticos de oposição.
Como repórter da sucursal do “JB” assinei a matéria sobre a dramática denúncia da corajosa Lilia, num episódio cujo verdadeiro motivo chega à informação pública, rica e detalhadamente situado no novo livro de Lucas Figueiredo. Mais do que confirmar fatos e suspeitas que eram levantadas nos encontros formais e informais das esquerdas da época, as páginas do “Ministério do Silêncio” configuram inclusive uma narração rica sobre a guerra civil brasileira travada nas remotas regiões do Araguaia.
Foi uma seqüela típica de um movimento de poderes como o de 1964 frente ao qual nenhuma sociedade permaneceria imune, conforme nos ensina a História desde os primórdios do mundo. O mergulho proporcionado por Lucas Figueiredo sobre os fatos e evoluções dos serviços secretos de1927 a2005 no Brasil é mais do que um trabalho de fôlego. Levanos a refletir que continuamos a vivenciar no Brasil um manejo político de poder público incapaz de se libertar das sombras do passado.
As práticas fisiológicas para a permanência no poder são incompatíveis com a nobreza da missão e das expectativas no plano ético de quem deve efetivamente governar. Mas os eleitos do Brasil ainda subestimam o rigor do inevitável julgamento da História e, por isso, certamente o País permanece tão distante da linha de decisões capazes de mudar a face da civilização tropical.