Anuário 2008 do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Fórum Brasileiro de Segurança Pública chega ao seu terceiro ano de existência e, como previsto, consolida sua opção pela transparência das políticas de segurança pública com a publicação da segunda edição do seu Anuário, no qual dados policiais são articulados a informações sobre pesquisas de vitimização, prisões, gastos públicos e, particularmente nesta edição, a uma discussão sobre o papel do território e dos municípios na segurança pública do Brasil. Mais do que apenas pretender a divulgação de dados, requisito fundamental da democracia e que as instituições policiais brasileiras começaram a se acostumar a partir da década de 1990, o Anuário busca compilar referências já disponíveis e dispô-las de modo a indicar seus limites, lacunas e, em especial, potencialidades, seja no âmbito técnico e metodológico, seja no nível político, cujas eventuais fragilidades de algumas dessas informações foram e, infelizmente, ainda são tomadas como justificativa para a não publicização das estatísticas no país. Significa dizer, portanto, que o Fórum Brasileiro de Segurança Pública faz uma aposta política explícita na transparência como fator fundamental de melhoria não só das próprias estatísticas existentes, mas, sobretudo, das políticas públicas retratadas. Sem conhecer e dar publicidade aos registros existentes, pouco podemos avaliar em relação à eficiência das ações empreendidas e ao padrão e características do crime, da violência e da forma como o Estado, em suas múltiplas esferas e poderes, lida com tais fenômenos. Por certo, compreende-se a necessidade de ponderações metodológicas que evitem o uso desconstrutivo dos cenários descritos. Num exemplo clássico, ranking de crimes só deve ser construído com controle de que os dados de todas as unidades classificadas tenham qualidade equivalente, pois, do contrário, unidades que investem pouco na divulgação de suas realidades seriam equivocadamente beneficiadas em comparação com aquelas que investiram em sistemas de registro e, por isso mesmo, tendem a apresentar um número maior de casos do que as primeiras. Exatamente por isso, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública agregou, neste ano, os registros policiais segundo grupos de qualidade estimada dos dados criminais, utilizando, para tanto, um parâmetro de classificação externo às instituições policiais. Os grupos foram construídos tendo-se por base os dados da área de saúde, que possui uma tradição mais antiga de controle epidemiológico de cenários e, por isso, avalia a qualidade dos seus registros. Assim, para cada Unidade da Federação, foram considerados o número de mortes por agressão (homicídios) e o porcentual de óbitos maldeclarados, ambos produzidos pelo Datasus, do Ministério da Saúde, agrupando-se, em termos comparativos, as Unidades com perfis semelhantes em relação a esses dois indicadores e estimando a qualidade dos registros criminais. A partir deste procedimento, os Estados foram classificados em três grupos: no grupo 1 encontram-se aqueles que possuem uma quantidade pequena de óbitos maldeclarados, o que seria indicativo de uma maior confiabilidade dos dados disponíveis, possibilitando comparações entre si. Compõem esse grupo: Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e o Distrito Federal. Já os grupos 2 e 3 reúnem os Estados que possuem uma grande quantidade de óbitos maldeclarados, com a diferença de aqueles pertencentes ao grupo 2 (Alagoas, Amapá e Rondônia) registram altas taxas de homicídio, enquanto os pertencentes ao grupo 3 (Acre, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima, Sergipe e Tocantins) apresentam baixas taxas de homicídios. Todavia, diante do elevado porcentual de óbitos maldeclarados, as comparações de Estados dos dois grupos precisam ser relativizadas e os cenários descritos não podem ser tomados como descrição exata da realidade. Em suma, essa classificação foi realizada para permitir análises mais acuradas sobre o quadro da segurança pública no Brasil e, adicionalmente, indicar situações que merecem atenção dos dirigentes públicos no que diz respeito a investimentos em sistemas de registro e divulgação. Porém, como toda inovação metodológica, sabemos que a forma como organizamos as informações não é a única e também pode ser passível de críticas. Todavia, acreditamos que ela suscita o bom debate; aquele que visa avaliar as ações substantivas da área e atribuir papéis e atribuições aos atores sociais envolvidos com a temática. Ainda nessa direção, a segunda edição do Anuário traz uma compilação de dados sobre ações desenvolvidas pelos municípios no campo da segurança pública, além de análises sobre o papel desse ente da federação no sistema de segurança pública, em termos de responsabilidades, atribuições e capacidades. Para além dos municípios enquanto esfera administrativa, buscou-se também uma reflexão sobre o papel do território na organização dos recursos de polícia e segurança pública, na medida em que é a partir do território que as políticas públicas organizam o espaço urbano e intervêm na qualidade de vida da população brasileira. Enfim, a expectativa é de que estejamos próximos de inaugurar uma tradição de publicação anual de dados, que já chega ao seu segundo ano, que permita que os principais dados da área sejam de domínio público e fomentem o debate republicano de idéias e políticas de segurança, sem as fricções políticas que eventuais segredos possam provocar.

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